Na paragem, as pessoas e os seus cansaços empenham-se na contagem impaciente. O painel digital anuncia o último minuto de espera pelo descarrilado há pelo menos vinte.
O pôr-do-sol chegou primeiro... Há algo nos descarrilados que distorce o tempo e o estende infinitamente.
O espaço é inevitavelmente afectado!
A lotação teórica permitida é praticamente espezinhada, prensada com a soma de ligeiros empurrões cínicos com origem na frente, causando sérias repercussões nas traseiras.
Paguei o bilhete, guardei-o no bolso e deixei-me levar pela corrente. Há calor, falta de ar e uma mistura espontânea de aromas humanos fora da validade percorre-me as narinas ao som dos auriculares da passageira que se encontra nas minhas costas.
Aquilo finalmente parou! Estiquei o braço direito, o pé esquerdo levantou cinco centímetros e agarrei-me ao varão gorduroso vertical metalizado. Os cabelos cinzentos e encaracolados de uma passageira anciã faziam-me cócegas no antebraço e a fome começava a apertar.
Dlim-dlim-dlim-dlim!
A luz vermelha intermitente do STOP despoletou movimentações provenientes dos mais diversos pontos do descarrilado. Parou, as portas abriram-se e um grupo de pessoas entrou pela porta de saída, evitando toda a fila para entrar na devida, e percorreram todo o corredor contra a corrente para passar o cartão na máquina.
Bip! Bip! Bip! Bip!
Baixei o pé, abandonei o descarrilado, enchi os pulmões de ar e fiz o resto do caminho a pé...